A Lei Complementar n. 123/2006 instituiu o regime do Simples Nacional com o objetivo de atribuir a micro e pequenas empresas um tratamento diferenciado. Neste sistema, portanto, os optantes podem recolher diversos tributos de forma unificada a partir da aplicação de uma alíquota reduzida. Conforme dados do Sebrae, no ano de 2022 cerca de 21 milhões de empresas eram optantes pelo Simples Nacional, o que mostra a importância deste regime tributário para as pequenas empresas. Contudo, em 2024, após anos de discussões, a Reforma Tributária teve aprovação, modificando assim diversos artigos da Constituição Federal e impactando pequenas empresas. 

Agora, a regulamentação desta reforma está em tramitação no Congresso Nacional, e muito se discute sobre quais efeitos práticos tais mudanças poderão impor aos optantes do Simples Nacional.

Neste artigo, demonstraremos os principais efeitos da Reforma Tributária no regime simplificado para pequenas empresas. Boa leitura!

O que é a reforma tributária?

A Reforma Tributária pauta-se em mudanças do sistema tributário brasileiro, as quais decorrem da aprovação pelo Congresso Nacional da Emenda Constitucional n. 132/2023. A alteração do texto constitucional promoveu diversas alterações no sistema tributária nacional e possui como objetivos

  • O crescimento sustentável da economia
  • A redução de desigualdades sociais e regionais 
  • A redução da complexidade da tributação, de modo a assegurar transparência promover maior cidadania fiscal.

Embora a reforma tributária já tenha ocorrido, em razão das alterações dos dispositivos constitucionais, sua regulamentação ainda pende de aprovação junto ao Congresso Nacional.

As principais mudanças da reforma tributária

As principais alterações que a reforma tributária promove têm vínculo à possível redução da complexidade do sistema tributário.

Dessa maneira, a reforma extinguiu 5 tributos até então vigentes, sendo 3 de competência federal, 1 de competência estadual e 1 de competência municipal. São eles:

  • PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social); e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) – de competência federal
  • ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) – de competência estadual
  • ISS (Imposto sobre Serviços) – de competência municipal

Além da criação da CBS e da IBS em substituição a 5 tributos existente, a reforma passará a adotar a não cumulatividade plena. Ou seja, todos os pagamentos de tributos ao longo da cadeia irão se tornar créditos de imediato. 

A ideia da reforma tributária com a instituição da não cumulatividade plena é desonerar a cadeia econômica, de forma que a tributação recaia apenas sobre o consumo final da mercadoria. Em razão dos tributos incidentes nas etapas anteriores gerarem créditos para os prestadores e fornecedores, a CBS/IBS é neutra para os negócios.

Impactos para o empreendedor 

Para os empreendedores de pequenas empresas, a reforma tributária demandará uma análise detalhada de todas as operações, de modo a verificar quais os reais impactos da modificação. Como indicamos nos parágrafos anteriores, a reforma pende de regulamentação junto ao Congresso Nacional, e por isso não há, ainda, ciência quanto à alíquota da CBS e do IBS. Estima-se, porém, que a alíquota será de 27,5%.

Desta forma, caberá ao empreendedor acompanhar a regulamentação da reforma tributária pelo Congresso Nacional para que tenha ciência quanto a eventual definição da alíquota, bem como quanto à instituição de eventuais regimes especiais.

O sistema de créditos na reforma tributária

Como indicamos, uma das principais mudanças da reforma tributária é a instituição da não cumulatividade plena. Neste cenário, todos os pagamentos de tributos poderão gerar créditos de imediato para o adquirente.

Para melhor entendimento, vejamos um exemplo de comercialização de uma garrafa de suco, tomando por base uma alíquota de IVA na ordem de 25%.

Exemplo prático do sistema de créditos

O produtor rural produz a laranja e realiza a venda da fruta para a indústria por R$10,00. Nessa operação haverá a incidência do IVA, que resultará no valor de R$2,50.

A diante, a fábrica adquire então as laranjas por um preço total de R$10,00. Ao finalizar o processo de produção faz a venda do suco para os supermercados pelo valor de R$25,00 e, em razão da venda, a fábrica terá que realizar o pagamento do IVA de R$6,25. Contudo, o valor do IVA incidente na operação anterior de R$2,50 se torna um crédito para a fábrica, e ela, portanto, somente fará o pagamento da diferença. Assim, recolherá o valor de R$3,75.

O supermercado, por sua vez, adquire o suco da fábrica pelo valor de R$25,00, possuindo o direito ao crédito de R$6,25. Ao realizar a venda deste produto para o consumidor final pelo valor de R$35,00, deverá recolher a título de CSB/IBS o valor de R$8,75. Contudo, como possui crédito de R$6,25 realizará o pagamento de apenas R$2,50.

Vejamos que todos os valores de recolhimento a título de CBS/IBS na cadeia somam o valor de R$8,75 (R$2,50 + R$3,75 + R$2,50). Essa soma é justamente o imposto incidente sobre a última operação de venda do supermercado para o consumidor final.

ProdutorFábricaMercado
VendaR$   10,00 R$   25,00 R$   35,00 
IVA – 25%R$     2,50 R$     6,25 R$     8,75 
CréditoR$          –   R$     2,50 R$     6,25 
À pagarR$     2,50 R$     3,75 R$     2,50 
TOTAL IVA  R$     8,75 

Reflexos da reforma tributária para as pequenas empresas

Apesar da Reforma Tributária modificar aspectos do Sistema Tributário Nacional, não houve alteração substancial para as micro e pequenas empresas. O Simples Nacional, regime tributário das ME’s e EPP’s continuará a existir. Porém, algumas observações devem ser feitas.

Recolhimento da IBS e da CBS

Com a reforma tributária, micro e pequenas empresas poderão escolher entre duas opções. A primeira opção se refere à apuração e recolhimento da CSB e do IBS, segundo as regras do Simples Nacional. Nessa hipótese, a transferência de créditos será proporcional aos valores de recolhimento de IBS/CBS.

Já a segunda opção é a de apurar e recolher o IBS e a CBS pelo regime normal. Ou seja, o IBS e a CBS deverão ser apurados por fora do regime do Simples Nacional. Nesta opção, a empresa poderá transferir créditos integrais da CBS e da IBS.

Impactos para pequenas e microempresas

A melhor análise das regras da reforma tributária quanto às micro e pequenas empresas demonstra que há grande risco de prejuízo econômico. Sabemos que o Simples Nacional é o regime que abrange o maior número de empresas no país, já que as facilidades das regras acabam garantindo um tratamento melhor para que essas empresas possam continuar com suas atividades econômicas.

Porém, a mudança quanto a transferência de créditos poderá resultar, por conta de uma pressão de mercado, a necessidade de alteração do regime. 

Como vimos, na reforma tributária as pequenas empresas poderão optar por recolher o IBS e a CBS através das regras do Simples Nacional ou então apurar e recolher esses dois novos tributos a partir do regime normal.

Na primeira opção, os clientes de empresas do Simples Nacional poderão se aproveitar somente de uma parcela do IBS/CBS, pois a transferência de créditos estará limitada ao valor recolhido pela empresa do Simples. Ou seja, o adquirente terá um menor valor de crédito para uso e, por consequência, possuirá um maior desembolso financeiro para pagamento da IBS/CBS. 

A impossibilidade de transferência integral dos créditos de IBS/CBS poderá fazer com que as empresas do Simples Nacional sofram uma pressão de mercado para que passem a apurar o CBS/IBS por fora, de modo a transferir integralmente os créditos desses tributos. Porém, ao apurar o IBS/CBS por fora, a empresa do Simples Nacional passará a se sujeitar a uma alíquota de aproximadamente 26%. Com isso, implicará em um aumento excessivo de sua carga tributária.

Deste modo, a reforma deve gerar uma preocupação para as empresas do Simples Nacional em razão da perda de competividade

Ao atender consumidores finais esse impacto é, porém, minimizado, pois não há transferência de créditos nessas operações. Contudo, o cenário é diferente para aquelas que atuam como fornecedores, pois correm o risco de se tornarem menos atraentes para seus clientes.

E o Simples Nacional?

O Regime do Simples Nacional não foi extinto pela reforma tributária. Contudo, a manutenção da empresa nesse sistema de apuração de impostos deverá ter análise com cautela, em razão das diferenças quanto à transferência de créditos de IBS e CBS.

As ME e EPP deverão verificar qual a sua posição na cadeia produtiva, além de estudar, com afinco, os efeitos de possível migração para o regime normal de apuração do IBS e da CBS. Apesar de ganhar competitividade, em razão da transferência de créditos, a empresa se sujeitará a uma maior carga tributária. Dessa forma, ela poderá colocar a própria manutenção da empresa em xeque.

Assim, embora não haja extinção do Simples Nacional, as pequenas empresas deverão estudar algumas modificações decorrentes da reforma tributária. Isso pois, a depender da situação, ela poderá se sujeitar a um aumento de sua carga tributária, em razão de pressões de mercado, sob pena de ser menos atraente para a cadeia produtiva.

Conclusão

Embora a Reforma Tributária seja necessária para diminuição da complexidade do sistema tributária no país, alguns pontos especiais merecem especial atenção.

O Simples Nacional possui importância, pois abrange aproximadamente 21 milhões de empresas, já que as simplificações deste regime e a menor carga tributária possibilitam essas empresas a manterem a sua atividade econômica.

Porém, a instituição de um IVA e não cumulatividade plena com exceções de transferências de créditos para as empresas do Simples acabará por gerar uma incerteza e possível prejuízo a essas empresas. Elas poderão sofrer uma pressão de mercado para alterarem a forma de recolhimento da CBS e do IBS para que possam transferir integralmente os créditos para seus adquirentes.

Desta forma, as empresas optantes pelo Simples Nacional deverão, anualmente, verificar e planejar suas atividades para que possam analisar qual a melhor forma de tributação.

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Escrito por Mateus Salgado

Autor Certificado Vamos Escrever, é bacharel em Direito pela USP-RP e Pós-Graduado em Direito Tributário. Possui quase 10 anos de experiência em Direito Tributário. Atualmente é advogado tributarista atuante na esfera judicial e administrativa, além de realizar trabalhos de consultoria. É um grande apreciador de séries e apaixonado por esportes. 📩 mateussalgado@vamosescrever.com.br Saiba mais sobre o autor