O cenário global vem pressionando governos e indústrias a adotarem medidas concretas em direção à descarbonização e à sustentabilidade. Nesse contexto, o Brasil deu um passo relevante com a implementação do Programa Mover (Mobilidade Verde e Inovação), que traz incentivos fiscais para o setor automotivo com foco em práticas sustentáveis.

Entre as principais mudanças, destaca-se a alteração na alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), instrumento que agora ganha um novo formato para fomentar a transição energética e tecnológica. Neste artigo, explicamos de forma clara e objetiva o que muda com o Programa Mover e como as alterações do IPI impactam consumidores, indústrias e o meio ambiente.

O que é o Programa Mover?

Criado pela Lei nº 14.836/2024, o Programa Mover é uma iniciativa do governo federal para estimular a produção e o desenvolvimento de tecnologias limpas no setor automotivo brasileiro. Sua proposta vai além da simples desoneração: visa incentivar a inovação industrial e pesquisa tecnológica, bem como a redução das emissões de carbono em toda a cadeia de produção.

Tributação Verde

O diferencial do Programa Mover está na adoção da tributação verde, conceito que se baseia na lógica de que quem polui mais, paga mais. Nesse modelo, o IPI passa a ter ajuste conforme o nível de sustentabilidade dos veículos: quanto menor a emissão de carbono, menor será a alíquota. Essa estrutura coloca o Brasil em sintonia com práticas que outros países já adotam, como por exemplo Alemanha, Noruega, Japão e Canadá.

Histórico: Da política industrial automotiva ao Mover

O Programa Mover é o mais recente de uma sequência de políticas públicas voltadas à indústria automotiva:

  • Inovar-Auto (2012–2017): Foco em nacionalização e eficiência energética.
  • Rota 2030 (2018–2023): Incentivo à inovação com metas técnicas e ambientais.
  • Mover (2024–): Avanço no modelo anterior, com maior foco em sustentabilidade, inovação aberta e alinhamento à transição energética.

Essas mudanças refletem uma tentativa do Brasil de atualizar sua política industrial às exigências ambientais globais.

Mudanças do Programa Mover

O Programa Mover estrutura-se em três pilares principais: estímulo à inovação, exigência de sustentabilidade e adoção de critérios tecnológicos avançados.

Créditos financeiros por investimento em PD&I

Empresas que investirem em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) poderão obter créditos financeiros proporcionais ao valor investido, que poderão, então, ser usados para abater tributos federais. Dessa forma, há o estímulo da produção de novas tecnologias, inclusive em startups e universidades parceiras.

Requisitos ambientais e tecnológicos obrigatórios

As montadoras participantes precisam comprovar que estão reduzindo emissões de gases de efeito estufa, aumentando a eficiência energética dos seus veículos e, além disso, adotando tecnologias de baixa emissão.

Sistema de pontuação ambiental

O Mover introduziu um sistema de pontuação com base em critérios de sustentabilidade. Veículos mais eficientes, com menor impacto ambiental, somam mais pontos, o que se reflete, portanto, em maior benefício fiscal.

Como funciona o novo IPI Verde

A alíquota do IPI para veículos passa a ter seu cálculo conforme o desempenho ambiental do modelo. Critérios como tipo de combustível, eficiência energética e emissões de CO₂ determinam se o imposto será reduzido, zerado ou elevado.

Exemplo prático:

Um veículo 100% elétrico poderá ter alíquota zero, enquanto um veículo com motor a combustão tradicional poderá ter alíquota majorada.

Operacionalização do modelo

A definição da pontuação e da alíquota será feita com base em regulamentações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), com apoio de órgãos como o IBAMA e a Receita Federal.

As montadoras precisarão entregar relatórios técnicos e certificados ambientais para assim validar seus benefícios fiscais.

Modelos já beneficiados

Segundo dados preliminares, modelos como o BYD Dolphin, Renault Kwid E-Tech e GWM Haval H6 já se enquadram para alíquota zero ou extremamente reduzida, dessa forma tornando-se mais acessíveis para o consumidor final.

Mudança no IPI

Embora o foco do Mover esteja no setor automotivo, o modelo de IPI Verde pode servir de base para reformas futuras do imposto, dentro do contexto da Reforma Tributária em andamento (EC nº 132/2023).

Possível expansão da lógica ambiental para outros setores

Espera-se que essa lógica seja levada para outros setores produtivos, como:

  • Eletrodomésticos e eletrônicos
  • Setor agrícola
  • Indústria de embalagens e cosméticos

Essa mudança poderá reforçar o papel do IPI como um tributo regulatório, voltado à indução de práticas mais sustentáveis em toda a economia.

Impactos para o mercado e a sociedade

Reação do setor automotivo

Montadoras como Volkswagen, Stellantis e BYD já anunciaram investimentos no Brasil com foco em mobilidade elétrica e híbrida. A Anfavea destacou o potencial do Mover para gerar empregos e ampliar a competitividade do Brasil frente a mercados estrangeiros.

Benefícios para o consumidor final

Com o IPI reduzido ou zerado, veículos sustentáveis se tornam mais acessíveis. Além disso, carros elétricos e híbridos geram economia com combustível e manutenção. Dessa forma é possível popularizar modelos mais limpos e eficientes.

Projeções econômicas

Segundo o governo, o programa deve atrair mais de R$19 bilhões em investimentos até 2028, com expectativa de gerar empregos qualificados, estimular a cadeia de fornecedores e aumentar a arrecadação com base ampliada.

Comparativo internacional

Outros países possuem uma abordagem semelhante ao Programa Mover. Alguns deles são: 

  • França: Sistema “bonus-malus” reduz imposto para veículos limpos e aumenta para os poluentes.
  • Noruega: Isenção total de tributos para elétricos e alta tributação para combustão.
  • China: Subsídios diretos à compra e metas obrigatórias de veículos elétricos por montadora.
  • EUA (Califórnia): ZEV Program obriga montadoras a venderem percentual mínimo de carros elétricos.
  • Canadá: Reembolso federal para quem adquire veículos limpos.

Análise jurídica e perspectivas regulatórias

O Programa Mover, ao alterar a base de cálculo do IPI, reforça o uso da tributação extrafiscal, ou seja, com função regulatória e não meramente arrecadatória. Especialistas apontam que, apesar de constitucional, o modelo requer regulamentações complementares claras para evitar insegurança jurídica.

Também se discute como o programa se integrará ao novo Imposto Seletivo previsto pela Reforma Tributária, o que poderá substituir ou absorver parte das funções do IPI no futuro.

Conclusão

O Programa Mover representa um avanço significativo da política industrial brasileira rumo à inovação e à sustentabilidade. A introdução da tributação verde por meio do IPI Verde é um instrumento moderno, que busca transformar o setor automotivo em um vetor de desenvolvimento limpo e tecnológico.

Mais do que uma medida tributária, o Mover é uma estratégia nacional para colocar o Brasil na vanguarda da mobilidade sustentável, estimulando investimentos, reduzindo emissões e modernizando a indústria. O sucesso do programa poderá abrir caminho para novas políticas ambientais em outros setores, e moldar um novo ciclo de desenvolvimento inclusivo e ambientalmente responsável.

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Autor convidado do Vamos Escrever, é bacharel em Ciências Contábeis e pós-graduado em Gestão da Qualidade Total, é professor universitário na área de Contabilidade Auditoria, Tributária, Fiscal e Perícia. Atua na área como Contador, e nos tempos livres, é admirador de belas-artes e leitor de História e Filosofia. 📩leonardopaganini@vamosescrever.com.br Saiba mais sobre o autor