O Código de Ética da OAB estabelece uma série de diretrizes da publicidade jurídica na advocacia, incluindo um capítulo inteiro que trata sobre o assunto – o provimento 94/2000. Segundo essa regulamentação, é possível verificar se o advogado pode fazer propaganda, bem como as regras que devem ser seguidas.
Não são raras as vezes em que jovens advogados e demais profissionais da área jurídica fazem questionamentos a respeito de como realizar a publicidade de seu trabalho e o marketing de suas atividades. De fato, não se pode negar que parece um contrassenso quando se pensa em algum profissional vender e incentivar demandas e brigas jurídicas.
Na verdade, essa ideia parece até mesmo contrária à essência do próprio Código de Processo Civil de 2015, que destacou a realização de resolução de conflitos por métodos alternativos.
Contudo, não é nada disso. A atividade jurídica é como as demais formas de prestação de serviços, e o profissional precisa ser visto e reconhecido para se manter no mercado. Claro que essa publicidade deve ser realizada com cuidado, atendendo ao disposto na OAB para, também, não criar um efeito contrário ao pretendido: ao invés de trazer clientes, acabar os afastando. Além disso, é preciso lembrar que a atividade jurídica não está limitada às longas demandas judiciais nos tribunais.
Ocorre que por exigir grande conhecimento do profissional, retórica e prática, os profissionais acabam se sentido limitados a fazer determinadas publicidades ou, até mesmo, publicar determinadas conquistas profissionais que enriquecem o seu currículo e mostram o quão qualificados e preparados já estão. E é então que surge aquela pulga atrás da orelha que leva o profissional a pensar se está dentro ou não do Código de Ética.
Com o objetivo de tirar essas dúvidas e acalmar o profissional, este texto apresenta breves comentários a respeito da publicidade e do marketing jurídico, respeitando, é claro, os debates e discussões envolvendo o tema.
1. O marketing não é uma matéria nova no meio jurídico: afinal, qual a sua importância?
Apesar dos inúmeros questionamentos dos profissionais sobre o que pode ou não publicar, é preciso pontuar que o marketing não é uma questão nova no meio jurídico. Afinal de contas, com um número cada vez maior de profissionais, como é possível alcançar um cliente sem se apresentar para ele?
Em uma área que cada vez mais exige conhecimento técnico, não são raras as vezes em que se pode observar grandes escritórios de advocacia divulgando premiações de seus sócios e integrantes, reconhecimentos e até publicações de artigos dos profissionais nos sites do escritório.
Essas formas de divulgação não são novas e servem para divulgar o profissional por meio do seu conhecimento intelectual. Inclusive, não há dúvidas que qualquer pessoa gostaria de ser representada e/ou orientada por um profissional que é uma autoridade no assunto. Logo, conquistas profissionais e publicação de artigos são formas de destacar o profissional.
Veja bem: em nenhum momento existe incentivo à litigância judicial.
O fato é que os escritórios há muito tempo fazem essa espécie de divulgação em sites e até mesmo em revistas especializadas. Não se pode esquecer também dos congressos e palestras que, muito embora contribuam de forma inquestionável para construção do conhecimento jurídico, não deixam de expor o patrocinador do evento.
Portanto, o marketing jurídico é uma prática já utilizada por escritórios de advocacia e profissionais da área jurídica e se mostra muito importante para o desenvolvimento do profissional. Esclarecido esse primeiro ponto, é preciso desenvolver alguns comentários sobre o objetivo do marketing jurídico e seus limites perante o Código de Ética da Advocacia.
2. Marketing jurídico é diferente de propaganda: como pode ser feita a publicidade jurídica?
Como já informado, não é proibido que os profissionais da área jurídica realizem publicidade, mas essa atividade deve estar de acordo com alguns limites. Logo, considerando a interpretação conjunta da Resolução 205/2021 do Conselho Federal da OAB, do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994) e do Código de Ética e Disciplina da OAB, conclui-se que o marketing jurídico não é proibido, mas sim a propaganda direta dos serviços advocatícios.
Além disso, foi com a intenção de complementar as normas sobre a publicidade que o Conselho Federal da OAB aprovou a recente Resolução nº 205/2021, que tem o objetivo de conceituar, permitir e estabelecer os limites do marketing jurídico, dando especial atenção aos avanços tecnológicos.
Essa norma significou um marco para a publicidade da advocacia, na medida em que não só permitiu expressamente o marketing jurídico (art. 1º da Resolução 205/2021), como conceituou a atividade como “Especialização do marketing destinada aos profissionais da área jurídica, consistente na utilização de estratégias planejadas para alcançar objetivos do exercício da advocacia” (art. 2º, inciso I, da Resolução 205/2021).
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Outra conceituação que merece destaque é a publicidade ativa e passiva, que se diferencia pelo fato de que na ativa o público-alvo é um número indeterminado de pessoas, enquanto na passiva a publicidade visa atingir apenas um grupo específico que busque a informação. Essa diferenciação, como pode ser notado, traz segurança jurídica aos advogados que podem agora enquadrar suas práticas em uma delas.
O marketing de conteúdo jurídico também foi tratado na resolução, sendo conceituado como estratégia publicitária que “se utiliza da criação e da divulgação de conteúdos jurídicos, disponibilizados por meio de ferramentas de comunicação, voltada para informar o público e para a consolidação profissional do(a) advogado(a) ou escritório de advocacia” (art. 2º, inciso II, da Resolução 205/2021). Contudo, essa permissão está condicionada a:
- Utilização da publicidade ativa ou passiva, desde que não esteja incutida a mercantilização, a captação de clientela ou o emprego excessivo de recursos financeiros, sendo admitida a utilização de anúncios, pagos ou não, nos meios de comunicação, exceto nos meios vedados pelo art. 40 do Código de Ética e Disciplina e desde que respeitados os limites impostos pelo inciso V do mesmo artigo;
- Na divulgação de imagem, vídeo ou áudio contendo atuação profissional, inclusive em audiências e sustentações orais, em processos judiciais ou administrativos, não alcançados por segredo de justiça, serão respeitados o sigilo e a dignidade profissional e vedada a referência ou menção a decisões judiciais e resultados de qualquer natureza obtidos em procedimentos que patrocina ou participa de alguma forma, ressalvada a hipótese de manifestação espontânea em caso coberto pela mídia (art. 4º, §2º);
- Para os fins do previsto no inciso V do art. 40 do Código de Ética e Disciplina, equiparam-se ao e-mail, todos os dados de contato e meios de comunicação do escritório ou advogado(a), inclusive os endereços dos sites, das redes sociais e os aplicativos de mensagens instantâneas, podendo também constar o logotipo, desde que em caráter informativo, respeitados os critérios de sobriedade e discrição ( art. 4º, §3º);
- Quando se tratar de venda de bens e eventos (livros, cursos, seminários ou congressos), cujo público-alvo seja advogados(as), estagiários(as) ou estudantes de direito, poderá ser utilizada a publicidade ativa (art. 4º, §4º);
- É vedada a publicidade mediante uso de meios ou ferramentas que influam de forma fraudulenta no seu impulsionamento ou alcance (art. 4º, §5º).
Embora esteja permitindo a prática de publicidade pela advocacia, o provimento também se mostrou preocupado com a prática que se limite a realizar a captação da clientela ou mercantilização da profissão, vedando:
- referência, direta ou indireta, a valores de honorários, forma de pagamento, gratuidade ou descontos e reduções de preços como forma de captação de clientes (art. 3º, inciso I);
- divulgação de informações que possam induzir a erro ou causar dano a clientes, a outros(as) advogados(as) ou à sociedade (art. 3º, inciso II);
- anúncio de especialidades para as quais não possua título, certificado ou notória especialização (art. 3º, inciso III);
- utilização de orações ou expressões persuasivas, de autoengrandecimento ou de comparação (art. 3º, inciso IV);
- distribuição de brindes, cartões de visita, material impresso e digital, apresentações dos serviços ou afins de maneira indiscriminada em locais públicos, presenciais ou virtuais, salvo em eventos de interesse jurídico (art. 3º, inciso V).
Além disso, a resolução traz a referência à publicidade profissional “sóbria”, discreta e informativa, sendo a divulgação que, sem ostentação, torna público o perfil profissional e as informações pertinentes ao exercício profissional, sem incitar diretamente ao litígio judicial, administrativo ou à contratação de serviços, sendo vedada a promoção pessoal (art. 3º, §1).
Desse modo, não é permitida a exibição de bens de alto valor aquisitivo, insinuando diretamente que eles são decorrentes do exercício da advocacia ou como forma de autopropaganda profissional. Isso não significa que o profissional não seja livre para postar suas conquistas patrimoniais, viagens e lazer; o que não pode é tentar mostrar isso com o intuito de dizer que é bem-sucedido na advocacia ou o quão lucrativo é escolher o caminho do litígio.
3. Como o advogado pode utilizar as redes sociais em seu marketing jurídico?
Sem dúvida alguma, o maior avanço proporcionado pelo decreto é a permissão para utilizar as redes sociais e demais ferramentas tecnológicas para impulsionar o marketing jurídico, com postagens e compartilhamento do conteúdo. Contudo, é importante ressaltar que publicar conteúdo jurídico não é dar consultoria gratuita ou assessorar terceiros.
Logo, isso significa que não é permitido ao profissional, após aquela postagem de conteúdo jurídico bem polêmica, ficar respondendo as dúvidas dos leitores de questões jurídicas sobre o caso ou outras controvérsias. Lógico que isso não proíbe o debate; mas uma coisa é debater a respeito da polêmica e outra é fazer consulta. Essa vedação se justifica no fato de que o Código de Ética ainda proíbe a mercantilização dos serviços jurídicos.
Outra coisa muito inovadora é a permissão para fazer lives em redes sociais ou vídeos. Contudo, da mesma forma que as postagens em redes sociais, especialmente nas lives, não é permitido o “tira dúvidas com advogado” ou a propaganda de produtos e serviços jurídicos, pois isso se caracteriza como consultoria gratuita e mercantilização dos serviços da advocacia, o que não é permitido. Por outro lado, o bom e velho debate e a exposição de conteúdo são permitidos.
Também é importante ressaltar que não é razoável ao advogado fazer uma live ou um vídeo comentado sobre um processo em que atuou, por mais destacado que seja. O estudo de caso é permitido, mas os comentários sobre o seu próprio caso, revelando determinados assuntos que somente o profissional teve acesso em razão da confiança entre cliente e advogado, não são permitidos.
Lembrando sempre que o advogado é um profissional que somente pode revelar segredo ou até mesmo testemunhar fato envolvendo seu cliente se o cliente autorizar e ele concordar (no sentido de que se entende que é dever do profissional analisar do ponto vista técnico se essa exposição não prejudicaria o cliente, mesmo que ele concorde em expor).
Assim, o anexo único da Resolução 205/2021 trouxe os seguintes cuidados ao advogado antes de postar conteúdo jurídico ou gravar vídeos e lives nas plataformas digitais:
a. Aplicativos para responder consultas jurídicas:
Não é admitida a utilização de aplicativos de forma indiscriminada para responder automaticamente consultas jurídicas a não clientes por suprimir a imagem, o poder decisório e as responsabilidades do profissional, representando mercantilização dos serviços jurídicos.
b. Aquisição de palavra-chave, a exemplo do Google Ads:
Permitida a utilização de ferramentas de aquisição de palavra-chave quando responsivo a uma busca iniciada pelo potencial cliente e desde que as palavras selecionadas estejam em consonância com os ditames éticos. Proibido o uso de anúncios ostensivos em plataformas de vídeo.
c) Chatbot:
Permitida a utilização para o fim de facilitar a comunicação ou melhorar a prestação de serviços jurídicos, não podendo afastar a pessoalidade da prestação do serviço jurídico, nem suprimir a imagem, o poder decisório e as responsabilidades do profissional. É possível, por exemplo, a utilização no site para responder as primeiras dúvidas de um potencial cliente ou para encaminhar as primeiras informações sobre a atuação do escritório. Ou, ainda, como uma solução para coletar dados, informações ou documentos.
d) Grupos de WhatsApp:
Permitida a divulgação por meio de grupos de WhatsApp, desde que se trate de grupo de pessoas determinadas, das relações do(a) advogado(a) ou do escritório de advocacia, e que seu conteúdo respeite as normas do Código de Ética e Disciplina e do presente provimento.
e) Lives nas redes sociais e Youtube:
É permitida a realização de lives nas redes sociais e vídeos no Youtube, desde que seu conteúdo respeite as normas do Código de Ética e Disciplina e do presente provimento.
f) Patrocínio e impulsionamento nas redes sociais:
Permitido, desde que não se trate de publicidade contendo oferta de serviços jurídicos.
g) Redes Sociais:
É permitida a presença nas redes sociais, desde que seu conteúdo respeite as normas do Código de Ética e Disciplina e do presente provimento.
Nesse sentido, tomando os cuidados detalhados acima, usando as redes sociais e demais plataformas com respeito às instituições democráticas e não fazendo propaganda de venda de serviços jurídicos, é plenamente possível e permitido ao advogado fazer uso das redes sociais para fins de marketing jurídico.
Além disso, a Resolução 205/2021 proíbe que o profissional divulgue conteúdos que, apesar de não se relacionarem com o exercício da advocacia, possam atingir a reputação da classe à qual o profissional pertence.
Assim como o Direito sofre constantemente transformações da sociedade e, ao mesmo tempo, altera as relações sociais, a profissão da advocacia também vem sendo constantemente influenciada pelas novas tecnologias e formas de divulgação. Não por acaso, a edição da Resolução 205/2021 veio em um momento de bastante clamor dos profissionais para que pudessem utilizar as redes sociais e demais plataformas digitais para sua publicidade.
E a resolução não decepcionou! Trouxe inovações e permitiu que a advocacia pudesse utilizar essas ferramentas em prol de seu desenvolvimento. A advocacia, como qualquer outra profissão, apresenta concorrência, o que demanda a utilização do marketing impulsionado cada vez mais pela internet.
Portanto, é possível que o profissional da área jurídica utilize as redes sociais e demais plataformas sem ofender o Código de ética profissional ou manchar a reputação da classe, desde que não passe a mercantilizar os serviços jurídicos como um produto meramente econômico.
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